“Deixar-se ir” não significa desistir de se esforçar, evitar responsabilidades, nem se entregar ao desespero ou se deixar levar pelos desejos, mas sim uma profunda sabedoria psicológica e filosofia de vida. Isso significa parar com a crítica incessante a si mesmo, aceitar suas imperfeições, permitir-se errar, sentir-se cansado, triste e até mesmo falhar. É libertar-se do padrão de “autoagressão” e tratar-se de uma maneira mais compassiva, mais sábia e mais sustentável. Como propõe a teoria da “autocompaixão” da psicóloga Kristin Neff, a verdadeira força não vem da severidade da autocrítica, mas sim da compreensão e da gentileza consigo mesmo.

Então, por que“deixar-se ir” é tão importante? Porque a autocrítica prolongada não apenas consome nossa energia mental, mas também pode levar a uma série de problemas psicológicos, como ansiedade, depressão e baixa autoestima. Isso nos coloca em um ciclo vicioso de “não fazer o suficiente”, onde nunca estamos satisfeitos e sempre estamos correndo atrás de um padrão inatingível. Quando aprendemos a nos deixar ir, encontramos verdadeira paz e liberdade interior, permitindo-nos enfrentar os desafios da vida de uma maneira mais saudável e alcançar um crescimento sustentável.

Identificando sinais: você está se criticando excessivamente?

Para“deixar-se ir”, primeiro é necessário reconhecer se você está em um estado de autocrítica excessiva. Este é um processo que requer alta autoconsciência. Aqui estão alguns sinais-chave que podem ajudá-lo a determinar se você caiu na armadilha da autocrítica.

Primeiro, reações emocionais anormalmente intensas.

Quando você completa uma tarefa, mesmo que o desempenho geral seja bom, se houver um pequeno erro, você não consegue se libertar, sentindo-se extremamente frustrado ou envergonhado. Por exemplo, você entrega um relatório no trabalho e o chefe comenta: “Está tudo muito bom, só precisa verificar um dado”, mas você passa a noite em claro pensando “por que não percebi isso?” ou “será que não sou capaz?”. Essa reação exagerada a pequenos erros é uma manifestação típica da autocrítica. Suas emoções não são baseadas em fatos objetivos, mas são sequestradas pelo “perfeccionismo”, amplificando os resultados negativos.

Segundo, uma maneira de pensar absolutista.

Você costuma se dizer “eu devo...”, “eu deveria...”, “eu nunca posso...”? Essas expressões de “devo” e “deveria” são frequentemente sinais de linguagem de autocrítica. Elas escondem um padrão de pensamento preto e branco: ou é perfeito, ou é um fracasso total; ou é tudo, ou é nada. Por exemplo, “eu devo acordar às seis da manhã para correr, caso contrário, sou preguiçoso” ou “eu deveria me comportar bem em todas as situações, caso contrário, sou um fracasso social”. Esse pensamento absolutista priva você da flexibilidade como ser humano, gerando uma forte autodepreciação quando não atinge os padrões.

Terceiro, comportamentos compulsivos.

Você se pega sempre revisando seu trabalho, mesmo quando já confirmou que está correto, ainda assim não consegue evitar de olhar novamente? Ou você procrastina tarefas por medo de errar, hesitando em começar? Esses são reflexos da autocrítica em nível comportamental. No fundo, você teme o fracasso e a crítica, e por isso recorre a preparações excessivas ou à evasão para lidar com a ansiedade. O resultado é que sua eficiência diminui, e sua energia é consumida em conflitos internos desnecessários.

Quarto, dificuldade em desfrutar das conquistas.

Mesmo ao alcançar bons resultados, você tem dificuldade em sentir verdadeira felicidade. Você pode pensar: “Isso não é nada de mais, outras pessoas fazem melhor” ou “Isso foi apenas sorte, na próxima vez pode não se repetir”. Você sempre foca no que “ainda não é bom o suficiente”, ignorando o progresso que já fez. Essa “incapacidade de desfrutar das conquistas” mantém você em um estado de busca constante, sem conseguir experimentar satisfação e felicidade.

Quinto, relações interpessoais afetadas.

A autocrítica não afeta apenas você, mas também impacta os outros. Você pode ter expectativas excessivas em relação às pessoas ao seu redor devido aos seus altos padrões, o que leva a relações tensas. Ou você teme expor suas falhas nas interações sociais, tornando-se reservado, artificial ou até evitando o convívio social. A voz crítica dentro de você pode torná-lo defensivo nas interações com os outros, dificultando a construção de conexões genuínas.

Se você se identifica com vários dos aspectos acima, é muito provável que esteja passando por uma autocrítica excessiva. O importante é que isso não é sua culpa, mas sim o resultado da interação entre a cultura social, experiências de crescimento e crenças internas. Reconhecer isso é o primeiro passo para a mudança.

Análise das raízes: por que é tão difícil nos deixarmos ir?

Depois de entender as manifestações da “autocrítica excessiva”, precisamos questionar: por que é tão difícil nos deixarmos ir? A formação desse padrão psicológico geralmente tem raízes profundas.

Primeiro, a influência da cultura social é profunda. Vivemos em uma era que valoriza a “luta” e o “sucesso”. A mídia, o sistema educacional e a cultura do local de trabalho transmitem uma mensagem: só com esforço contínuo e superação de si mesmo é que se pode obter valor e reconhecimento. Esse ambiente tende a gerar uma mentalidade de “meritocracia” — o valor de uma pessoa é totalmente medido por suas conquistas. Nesse contexto, qualquer “imperfeição” pode ser vista como “fracasso”, levando à autocrítica.

Segundo, experiências de crescimento moldaram o crítico interno. Muitas pessoas na infância podem ter passado por disciplina rigorosa ou pais com altas expectativas. Elas foram ensinadas a “ter que ser o primeiro”, “não podem chorar” ou “devem ser compreensivas”. Com o tempo, essa crítica externa se internaliza como um “crítico interno”, tornando-se parte do nosso diálogo interno. Mesmo na vida adulta, esse “crítico interno” continua sussurrando: “você não é bom o suficiente”, “você ainda não se esforçou o suficiente”.

Além disso, a armadilha do perfeccionismo. O perfeccionismo não é a busca pela excelência, mas sim um padrão patológico e irrealista. Os perfeccionistas temem o fracasso e a avaliação, e por isso se esforçam ao máximo para evitar qualquer erro possível. Mas o problema é que a perfeição não existe. Quando a realidade nunca pode atingir o padrão ideal, a autocrítica se torna a única saída.

Por fim, o medo da “fragilidade”. Deixar-se ir significa reconhecer suas limitações, erros e emoções. Isso requer coragem, pois equivale a mostrar a si mesmo e aos outros sua “fragilidade”. Para muitas pessoas, a fragilidade é vista como um sinal de fraqueza, algo inaceitável. Portanto, elas usam a autocrítica para esconder a fragilidade, tentando provar que são “fortes o suficiente” por meio de “esforços maiores”.

Essas raízes se entrelaçam, formando uma rede psicológica complexa que dificulta o “deixar-se ir”. Mas é ao enxergar essas raízes que podemos quebrá-las de maneira mais direcionada.

Caminhos práticos: como realmente “deixar-se ir”?

Reconhecer o problema é apenas o começo; o verdadeiro desafio está na ação. Como transformar “deixar-se ir” de um conceito em uma prática diária? Aqui estão algumas abordagens práticas.

Primeiro, pratique a autoconsciência e identifique a voz crítica. Sempre que você se sentir ansioso, frustrado ou se depreciando, pare e pergunte a si mesmo: “O que estou dizendo a mim mesmo agora?” Escreva esses pensamentos críticos, como “eu sou realmente inútil” ou “como eu estraguei tudo de novo”. Ao externalizar esses pensamentos, você perceberá que eles geralmente exageram e carecem de base factual. Você pode tentar dar um nome a esse “crítico interno”, como “Pequeno Crítico”, e então dizer a ele: “Obrigado por me lembrar, mas agora eu escolho não te ouvir.”

Segundo, substitua a autocrítica pela autocompaixão. Quando você comete um erro ou enfrenta uma frustração, tente tratar-se como trataria um bom amigo. Pergunte a si mesmo: “Se meu melhor amigo estivesse nessa situação, como eu o confortaria?” Você pode dizer: “Está tudo bem, todo mundo comete erros” ou “Você já fez o seu melhor, agora descanse um pouco”. Envie essas palavras calorosas para si mesmo. Estudos mostram que a autocompaixão pode reduzir significativamente os níveis de ansiedade e depressão, aumentando a resiliência psicológica.

Terceiro, estabeleça metas realistas e alcançáveis. Abandone o pensamento de “devo ser perfeito” e estabeleça padrões de “bom o suficiente”. Por exemplo, não exija de si mesmo “devo me exercitar uma hora todos os dias”, mas sim “devo me exercitar três vezes por semana, 20 minutos cada vez”. Metas pequenas são mais fáceis de alcançar e podem acumular um senso de realização, ajudando a construir confiança gradualmente.

Quarto, permita que as emoções existam, sem reprimir ou se afundar nelas. Quando você se sentir triste, irritado ou cansado, não se force a “se animar”. Você pode dizer a si mesmo: “Estou me sentindo triste agora, e isso é normal.” Dê a si mesmo algum tempo para sentir as emoções, como sentar em silêncio por um momento ou escrever um diário para expressar seus sentimentos. As emoções são como o clima, vêm e vão; o importante é aceitá-las com uma mente aberta, em vez de lutar contra elas.

Quinto, pratique a meditação mindfulness. O cerne da mindfulness é “prestar atenção ao presente de forma consciente e sem julgamento”. Dedique 10 minutos por dia para se concentrar na respiração ou nas sensações corporais; quando pensamentos intrusivos (especialmente pensamentos autocríticos) surgirem, gentilmente traga sua atenção de volta. Essa prática pode ajudá-lo a manter distância dos pensamentos, reduzindo a intensidade com que você é arrastado por ideias negativas.

Sexto, aprenda a dizer “não” e estabeleça limites saudáveis. Não se esgote excessivamente para agradar os outros ou atender às expectativas externas. Defina claramente seus limites e tenha coragem para recusar pedidos irracionais. Lembre-se de que proteger seu tempo e energia não é egoísmo, mas sim amor-próprio.

Sétimo, celebre pequenos progressos. Ao final de cada dia, revise as coisas que você fez bem, mesmo que sejam pequenas conquistas, como “hoje comi no horário” ou “expressei minhas ideias para um colega”. Anote essas realizações e revise-as regularmente; você perceberá que, na verdade, está sempre progredindo.

Conclusão: a liberdade começa com a compaixão interior

“Deixar-se ir” é uma revolução interna. Exige que rompamos com a inércia de pensamento que perdura há muito tempo e redefinamos o que é “bom” e o que é “sucesso”. A verdadeira força não é nunca cair, mas sim levantar-se gentilmente após a queda; o verdadeiro crescimento não é forçar-se a atingir limites, mas sim avançar de forma constante na aceitação.

Quando você começa a se deixar ir, descobrirá que a pressão interna diminui, a criatividade se restabelece e as relações interpessoais se tornam mais autênticas. Você não estará mais preso às correntes do “devo ser perfeito”, mas sim terá a liberdade de escolher — pode escolher se esforçar ou descansar; pode escolher perseguir ou soltar.

Isso não é fácil e requer prática contínua e paciência. Mas acredite, cada vez que você escolhe ser gentil consigo mesmo, está plantando uma semente de liberdade em seu interior. Um dia, ela brotará, permitindo que você encontre sua própria paz e força em um mundo complexo e caótico.

Deixar-se ir não é o fim, mas o ponto de partida para uma vida mais abundante.

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